Direito Real de Habitação por Partilha

Foi apresentado uma Carta de Sentença Notarial, extraída mediante materialização do processo de Inventário e Partilha, onde na sentença, o juiz, atribuiu à viúva, com fundamento no art. 1831, do CC, o direito real de habitação sobre o imóvel residencial, pelo valor de R$ 12.651,64 (1/3 do valor venal). Para cada herdeiro filho, a parte ideal de 1/3 sobre a nua propriedade do referido imóvel, no valor de R$ 8.434,32 (2/3 do valor venal divididos pelo número de herdeiros)

Pergunta:

É possível o registro da presente carta de sentença da forma acima? Caso seja possível, como proceder?

Resposta:

  1. Inicialmente informamos de que será necessária a apresentação da certidão de casamento do autor da herança com a viúva para fins de prévia averbação;
  2. Conforme nossa resposta anterior o direito real de habitação previsto no artigo 1.831 do CC é passível de registro no RI., ou seja, é perfeitamente possível o seu registro (Ver também processo CGJSP de nº 1015197-65.2016.8.26.0309);
  3. Apesar de as regras do usufruto se aplicar a habitação, esta se diferencia do usufruto, pois é direito personalíssimo que só se limita a ele, e é restrita a ocupação. Para o direito real de habitação, há necessidade de que a construção esteja previamente averbada, e o direito real de habitação nos termos do artigo n. 1.831 do CC também é possível desde que o imóvel destinado à residência da família seja o único a inventariar;
  4. No caso não será possível o registro da carta porque na matrícula do imóvel não existe construção (residencial) averbada e não será possível o direito de habitação sobre terreno. E o direito real da habitação é direito personalíssimo que só se limita a ele, e é restrita a ocupação. E diferente do usufruto (uso e gozo). Portanto instituído o direito de habitação (ocupação) a favor da viúva, por não ser não se tratar de usufruto não haveria via de consequência a nua propriedade sobre o imóvel e partilhada a três filhos. Devendo a partilha, o pagamento aos três filhos herdeiros ser a propriedade e não a nua propriedade, por não se tratar de usufruto quando haveria o desdobramento na propriedade em usufruto e nua propriedade mas de direito real de habitação que uma vez constituído não ocorre o desdobramento da propriedade, portanto não haverá nua propriedade. E nesse sentido além da prévia  averbação da construção residencial a partilha deveria ser aditada para que uma vez registrado concomitantemente com o direito de habitação uma vez averbada a construção residencial, fosse também registrado a partilha da propriedade na proporção de 1/3 para casa herdeiro filho, mas não a nua propriedade, como dito, por não tratar-se de usufruto;
  5. Eventualmente a partilha poderá ser aditada, re-ratificada para que seja feito o pagamento do usufruto do imóvel (terreno) para a viúva e o pagamento da nua-propriedade para os três filhos herdeiros na proporção de 1/3 para cada um. E desta forma a construção poderia ser averbada oportunamente, porque não seria mais direito real de habitação e o usufruto seria também personalíssimo, vitalício, e com o direito de uso e gozo, e não somente de ocupação.

É o que entendemos passível de censura.

São Paulo, 08 de Setembro de 2.019.

Pergunta anterior:

Diante do requerido também comparecente como autora na ação constante do processo, junta a r. sentença ali prolatada, onde o MM. Juiz reconheceu a união estável entre a viuva e o falecido, e diante disso, concedeu-lhe o direito real de habitação, do imóvel, cujo imóvel encontra-se titulado em nome da herdeira ascendente, pedindo que este fato seja noticiado na matricial.

Isto posto, pergunto:-

1.* nos termos do art. 167, inciso I, nº 07, da Lei 6015/73, posso registrar esse direito na mencionada matricial ?

2. * ou “ex vi legis” ou seja, por força de lei, este direito já garante o direito de moradia à viúva ?; ou ainda

3. * o documento a ser juntado seria o r. mandado extraído dos autos ?

RESPOSTA:

2. Sim, “Ope Legis” (por força de lei) a viúva já tem o direito real de habitação (artigo 7º, parágrafo único da Lei n. 9.278/96 e artigo nº. 1.831 do CC), ainda mais que recentemente o STF equiparou a companheira ao cônjuge sobrevivente para fins de direitos sucessórios;

1. Não nos termos do artigo n. 167, I, 7 que é quando resulta de direito de família, mas sim, nos termos do atual entendimento, em pese decisão em contrário do CSMSP de n 990.10.030.896-3. Ou seja, deverá proceder ao registro do direito real de habitação a favor dela. A situação, até bem pouco tempo não era tranqüila considerando-se o artigo 167, I, 7, da LRP., no entanto essa posição vem sendo modificada face ao princípio de concentração (que nada mais é do que a previsão legal de que todos os atos com reflexo sobre a propriedade imobiliária, quer em seu aspecto objetivo, quer em seu aspecto subjetivo, devam adentrar obrigatoriamente no fólio real). O IRIB tem se posicionado na defesa da amplitude desse princípio, em que a matricula deve agregar, para ampla publicidade a terceiros, atos relacionados com o imóvel.

Há entendimentos de que o direito real de habitação previsto no artigo 1.831 do CC guarda ligação com o direito das sucessões, tem natureza jurídica e considera-se afastada a incidência da exceção prevista na Lei de Registros Públicos (art.167, I, 7, LRP).

E tem-se entendido que o direito real de habitação previsto no artigo 1.831 do CC, assim como aquele previsto nos artigo 1414/1416 do mesmo codex, deve sim ser levado ao registro imobiliário, por se tratar de legado legítimo (direito das sucessões) e por ser indispensável o seu registro para atendimento da função social da propriedade e do direito de informação previstos na Carta Maior. (nesse sentido ver: obra Direito Registral Imobiliário – Editora SAFE – Porto Alegre 2001, de autoria de Ademar Fioranelli – páginas 401 e 402, e ainda excelente trabalho de Luciano Lopes Passarelli – O Direito Real de Habitação no Direito das Sucessões – Revista do Direito Imobiliário – IRIB de nº 59 páginas 119/125). Ademais nos termos do artigo de n. 167, II, 12 seria possível a sua averbação.

3. O requerimento no qual falta a profissão da requerente e que nele poderia ser complementado acompanhado de cópia da sentença não é documento hábil para o ato de registro, devendo ser apresentado mandado, ou carta de sentença com o trânsito em julgado;

4. Na cobrança de emolumentos adotar-se-á por analogia o valor venal do imóvel, considerando-se 1/3 como nos casos de usufruto.

Apesar de o usufruto se diferenciar do direito real de habitação, a este se aplicam as regras do usufruto.

Como não há previsão na Tabela II – Dos Ofícios de Registro de Imóveis para a cobrança dos emolumentos, no caso do Direito Real de Habitação, adotar-se-á por analogia o valor venal do imóvel considerando-se 1/3 como nos casos de usufruto, vez que geralmente esse direito real de habitação decorrente de sucessão (legal) é gratuito.

É o que entendemos passível de censura.

São Paulo, 28 de Agosto de 2.017.

LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973.

 Art. 167 – No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos.                      

I – o registro:                   

 7) do usufruto e do uso sobre imóveis e da habitação, quando não resultarem do direito de família;

LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002.

Da Habitação

Art. 1.414. Quando o uso consistir no direito de habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a pode alugar, nem emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua família.

Art. 1.415. Se o direito real de habitação for conferido a mais de uma pessoa, qualquer delas que sozinha habite a casa não terá de pagar aluguel à outra, ou às outras, mas não as pode inibir de exercerem, querendo, o direito, que também lhes compete, de habitá-la.

Art. 1.416. São aplicáveis à habitação, no que não for contrário à sua natureza, as disposições relativas ao usufruto

Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar

LEI Nº 9.278, DE 10 DE MAIO DE 1996.

Art. 7° Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de alimentos.

Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.

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